05/12/2011
É que essa magia dos craques que assisto
não é de outras teologias
não é ocultismo
não é vodu, xamanismo,
pajelança anti-lógica
encolhedora de cabeça
ou amarração do amor.
.
É só ilusionismo.
O truque de passar a bola rápida entre os pés
de ter botão debaixo da mesa
fundo falso, nuvem de fumaça:
é David Copperfield.
.
O tigre que cavalgam é digital,
Siegfried and Roy dos melhores momentos:
a bola faz piruetas (mas dentro não vemos o controle remoto).
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Não sabem ervas, nem invocam espíritos invocam espíritos:
são intrincados mecanismos de silício e evangelho,
monoteístas demais pra possessões.
.
Ilusionam como executivos:
vim, vi e venci.
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Não são magos:
são joysticks.
O lance
é não perder a piada:
piu.
.
O comentário:
comentamos o que foi comentado,
comentando com comentários
o comentário.
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Blábláblá…(x140)
A fronteira do Brasil usa cinto de castidade:
mestre forasteiro não bota a mão na seleção!
Menina pura criada pra ser retalhada
entre o capital internacional,
não terá fräulein gringa ensinando
segredos de liquidificador.
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Na TFP do futebol, como esquecer da pátria?
Imagina o time de guerreiro
guiado por um argentino
(Oh, Capitán, mi Capitán!)?
.
Na TFP do futebol, como tirar das famiglias da bola
o direito de ter o filho bacharel em futebolês
sendo técnico do escrete pentacentão?
Imagine sir Professor Sparrow, PhD.
.
Na TFP do futebol,
o Brasil é para os brasileiros.
.
Só numa hipótese, o gringo viria:
se a Propriedade continuar dando prejuízo.
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Afinal, a TFP brasileira conserva a Tradição:
mas a Famiglia precisa de Propriedade.
Tem esse lado Pós-moderno dele,
de falar calculadinho,
que deixa tudo chato pra caralho.
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Mas tem o outro.
Esse é Romântico.
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Romantismo de só desejar uma camisa.
E não se trata de monogamia fingida
de casal oficial – é Amor.
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Romantismo de dizer pro torcedor:
compra minha camisa e fica sossegado,
não vai mudar ano que vem.
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Não ser folhinha de calendário.
Ser monumento.
Não são as bandeiras que matam.
São as falanges que as seguram –
mas essas são parte fundamental da máquina.
São mastros onde a política pendura
sua bandeira de pirata,
eixos violentos que fazem a linha andar na linha reta.
.
Bandeiras são gritos que dão em linha curva:
o que pensamos, mais o braço e o vento.
Como um caldeirão de almas que se mexe,
como o mar, se defendesse ideias.
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Gritos não param no ar.
Quando se mata, é na garganta.
Cacetete no pescoço,
mordaça,
cala que nem te escuto.
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As bandeiras voltam.
A violência nunca saiu.
Desmaterializou de madeira
em braço,
cavalo
ou confederação.
Em português-brasileiro,
Democracia
significa
governo do demo.
.
Então, abusa, abraça o diabo
(benefício de ser assexuado),
e faz um grande país do teu gosto.
É estar na moda:
customizar
leis
a gosto do freguês
(e seus costumes).
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Se se morre de fome básica,
o que esperar do ópio?
(agentenãoquersócomidaagentequercomidadiversãoearte)
Se gente morre, é o limite.
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E lá vai futebol,
gangsterizando.
Se acha ruim, problema é teu, torcedor.
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Nem falo em censura – os times não têm ouvido.
Não precisa de jagunço de espingarda:
o campo é longe pra tua voz se dissipar em vaia.
E vaia é assim: palavrão esfarelado em palavrinha.
Ex.: vai tomar no cu! → u
.
O futebol é empresa pra quem você torce
o coração ao meio
e pinga sangue.
Mas é capitalismo duas caras:
uma olha pra hoje (o olho brilha em euro),
outra pro passado (quebrou, pagou).
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O torcedor clama: um SAC, um Ombudsman,
uma Ouvidoriazinha que me ouça.
Um e-mail, ainda que em formulário.
Um atendente de telemarketing, ainda que mal-entendido.
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Mas não.
Se vira, meu.
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Na Democracia sem votos
dos times de futebol,
Presidente não te escuta
nem em ano
(de colégio)
eleitoral.
É Nelson Rodrigues puro:
a irmã cerebral, que dá passes de gênio;
a irmã corporal, que dribla até a si mesma.
.
A cabeça lê o jogo, faz planos pras jogadas e anda ereta pelo gramado.
A corpo dança, pula, seduz, humilha, goza e saracoteia pelo baile.
A cabeça avalia os pretendentes (poucos);
A corpo desdenha dos bobos (muitos).
A cabeça reclama que o pai não lhe dá mimos, só cobranças;
A corpo requebra no colo de milhões do papai.
A cabeça lembra um craque d’outrora;
A corpo joga em video-game.
A cabeça se esforça pra sorrir;
A corpo se derrete pra qualquer um.
A cabeça diz não vamos entrar nessa;
A corpo pega o copo do marinheiro e bebe com volúpia.
A cabeça sabe o que é volúpia, mas não tem;
A corpo não sabe nada, mas é.
Isso vai dar guerra…
.
No último ato,
a irmã-cabeça está cortada
num time de segunda linha da Europa.
A irmã-corpo é estátua-viva:
PAI (apertando as bochechas):
olha só que
mito-querido do papai!
Nos estádios de futebol
vemos mais do que a poesia fácil
dos craques.
Há o poema-sujo
das coisas que são
do
mundo –
como eu e você.
.
Só somos iguais na camisa
(e nos palavrões aos técnicos):
só te abraço aqui, em suma.
Das catracas do mundo pra fora,
segue tua vida.
.
Não acho mais que o campo
é portal para um mundo encantado:
é catraca pra dentro
do mesmo mundo.
Círculo de concreto
onde se joga bola
e ganha dinheiro.
.
Assim,
sigo meu caminho de cidadão,
me desviando dos cambistas
e dos policiais de capacete e escudo
e dos cavalos
todos
que seguem seus caminhos de cidadão.
.
Mas eis que começa tumulto.
Os garis
perseguem os vendedores de bebidas.
Limpam mais que as latas
(que guardam para vender depois – caminhos de cidadão).
Limpam a imoralidade do não pagar impostos,
lavam a debandada de divisas da municipalidade,
colaboram com os patrocinadores,
valorizam o comércio legalizado
(caminhos de cidadão).
.
Há quem veja futebol nisso tudo.
O drible do camelô,
o pique do gari
e a aproximação lateral do outro
até o bote certeiro
que rouba a caixa de isopor como bola.
Há quem peça falta,
grite com a Polícia,
se absurde.
Mas segue o jogo,
e cada um com seu azar.
O camelô cai de boca no pretume do asfalto pisado.
Caem as latas, o gelo, o isopor.
Cai assim o crime, o medo, a violência.
Cai um país de corruptos
(metonímia no corpo pobre do homem:
a pequena parte [paga] pelo todo).
Cai a grana investida pra gerar mais grana
(caminhos de cidadão desempregado).
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Os garis esperam os Guardas beberem,
para pegar as latinhas.
Assim,
vão obtendo,
aos trancos,
sua cidadania
brasileira.
[poema em processo]
.
Daqui do Brasil, de todas as épocas do meu cérebro,
saúdo-te, Javi, saúdo-te, meu irmão em Universo.
Eu, sem vestir camisas de times por ter esse nojo
que compartilhamos, te saúdo.
Não emprestar peito para out-door do que faz câncer,
do que apodrece esse jogo de bola
que aprendemos a gostar desde meninos.
.
Como estive pensando em você essa noite, Javi.
A coragem de dizer não,
como se essa palavra curta fosse montanha e desfiladeiro
e você tivesse a coragem de subir e se pendurar
num céu de poucos.
Mas você diz que não há céu.
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Incendiando bancos, devolvendo carros e carreiras,
que garoto será você na pelada na rua que começa daqui a pouco?
Qual dirá: “para a bola, porque vem vindo uma senhora e ela é gente”?
Esse terá teu nome gritado nos lances,
escreverá na camisa comprada com dificuldade pelo pai
teu nome estranho de espanhol.
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Você diz Capitalismo e todos dizem besta:
no ônibus lotado, que finaliza o dia de durezas,
todos queriam o carro que você renega.
E o dinheiro que você abre mão
não é nem troco para os craques daqui
(mas daria – e sobrava – para muitas jantas de hoje).
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Te saúdo deste país próspero, que nunca se iludiu tanto.
Todos são felizes, pois há muito dinheiro e pouca falta
(e quando falta, falta pra outro).
Aqui, Javi, um homem perde em um dia
o que 4.000.000 ganhariam num mês.
E ainda temos futebol.
.
Professor de coragem, anti-o que for desumano,
leva tua revolta pelo mundo,
mostrando que as máfias persistirão
enquanto criarmos máfias para acabar com elas.
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O importante, Javi, é que você não é herói, mito ou deus.
Nunca te chamarão de gênio, nem terá fotos de gol nos jornais.
Não estará em Copa do Mundo, nem nos álbuns de figurinha.
Pelo contrário, aparecerá teu nome do lado da chamada: LOUCURA
nos tablóides que são vendidos como verdade por essas bandas.
E muitos dirão: mas quem era ele para parar?
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É aí que eu gosto.
Gosto dessa declaração de humanidade,
deste assumir-se gente e destruir a própria estátua
(que, convenhamos, nunca foi levantada).
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Você diz Não! e sai.
Para as Histórias do Futebol?
.
Me parece que você prefere mais
sair da história
e entrar na vida.
E uma hora os ricos perderão a Bolsa
(roubada por outros ricos).
E os postes das ruas serão pouco:
a luz virá do fogo.
E a cidade uma imensa crackolândia da Bolsa supra-citada.
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E também futebol
vai sentir: os milionários
verão que seu dinheiro
que iludia pontes,
só cavava abismos.
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Um perde 5 milhões na especulação pessoal.
Pedestres se homicidam nos carros.
A Rota mata.
O campeonato empolga, mas o ônibus desanima.
O sistema-latrocida: mata pra roubar.
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Barões da bola acendem seus charutos com notas de meninos.
Estes: dinheiro, iate, mulheres, carros, mansão, mulheres, dinheiro, iate.
Sorte que a vida é retrovisor
(no espelho, as coisas parecem maiores do que realmente são).
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O ópio do povo
canal(h)iza.
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A história não ensina:
ela me largou quando acabou meu dinheiro.
Tive, amigos, que, sumiram, etc, etc, etc.
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Mas há um debate fundamental na nação:
o papel do cu.
Cu-opinião: cada um dá o seu.
Em português-brasileiro: você pode dar o seu cu, mas defenderei até a morte o direito
de você morrer por isso.
Meio: Ricardo Teixeira caga um monte. Outros dão o cu.
E o Brasil mais preocupado com o que entra do que com o que sai
(isso é Bíblico, senhores legisladores).
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Só que,
no meio sujo do mar de moedas da bola,
um homem diz:
Chega!
Afasta de mim esse cálice, que eu não vou cair nessa de cicuta.
Fique com tuas coisas, que meu reino não é daqui.
Mas mostraram o mundo e ele disse não!
Iate, mulheres, mansão, carros, dinheiros – não!
O jogador em construção diz não!
Lhe dizem é normal ser jogado do desfiladeiro
e cair no colchão de notas
onde repousará sua cabeça
e ele diz não!
Aquele que diz não
e ofende ao usar palavra velha:
Capitalismo.
.
Javi Poves levanta o braço e diz não!
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Nós, utopistas,
enxergamos uma imensa Ola
que levantará pra
dizer junto:
não!
São nóias buscando o craque na balada:
zumbis desnorteados atrás da pedra
pra apedrejar o outro.
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Relação doentia,
aquela coisa de acariciar com navalha na mão:
se eu te amo e tu (diz que) me amas
como poderei te libertar?
.
Tá feito: troca o time de homens
pelo de joão-bobos
(o balançar sóbrio dos bonecos de plástico).
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Assim, torcedor, teu time joga bem.
Mas você,
doidaço na arquibancada,
vai perceber?
Todo o milharal de gente junta
paga (só nesse jogo)
o salário do atacante
indolente.
.
Descer essas escadas do estádio
nos faz mais atletas
do que o atacante
indolente.
.
A namorada enojada,
que chuta a lata de cerveja,
chuta melhor que o atacante
indolente.
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É que daqui de cima a gente não vê:
há uma poltrona de repouso
e o atacante
faz a renda
no seu pé-de-meia.
A palavra corta dos dois lados:
– denota assistir do lado de lá do palco
– denota pagar a festa do pós-jogo.
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Estranha ambivalência:
1) parceria-público-privada
investimento público
cargo público.
2) hospital público
banheiro público
público pagante.
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Parceria dissecada:
o público entra com a bunda,
o privado entra com a mão.
Mais uma placa pra Vila Belmiro.
Mas não precisa reescrever uma velha.
Põe coisa nova, meio assim:
“Neste gramado, futebol significa pé e bola”
Nasci em 82:
cresci ouvindo “Futebol-arte para bebês”.
O maestro era Telê.
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Aquele sorriso que sai do banco
e atravessa o mundo na madrugada
chegou até minha infância de futebol.
O homem sério atrás do seu chiclete,
era alegria de menino.
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Poeta Romântico da bola,
do tempo que jogadores tinham epítetos:
esse Fio de Esperança
(de que a gente volte um dia…).
.
Ah, Telê, é fácil te fazerem de gesso
num andor capenga colocado em vestiário
ou te congelar teoria
no escapulário-fetiche de um comentarista.
Quero ver te colocarem em campo!
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É preciso te canibalizar
e que te ensinem aos moleques das escolinhas
e que coloquem teus esquemas nos botões de todo o mundo.
Apologista do que é arte,
ninguém quer-te morto em museu.
Cera cândida pegando pó nas décadas do século XX.
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Evoé, Telê!
Um time não se faz distribuindo máscaras
com a mesma cara de papelão.
Como colocar coletes na pelada –
mas dar azar de cair no time dos fominhas.
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Fotos com o time perfilado não admitem
pose de Orkut (e as melhores agregam
o massagista, na democracia do nós).
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Ninguém precisa invocar
guerreiro
patriota
esquadrão da morte
família
ou 144 mil de tribo nenhuma.
A palavra disponível
ainda pode ser
equipe.
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E que tenha a fantasia
de agregar 3 milhões de corações:
de tanto amor que têm
são, no fundo, só um.
Papo furado de fair play:
o sujo falando do mal lavado.
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Fair play financeiro:
notinhas do Jogo da Vida
real
pagando a festa.
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Fair play higiênico:
Omo pra tirar o amarelo que fica no cartão
(criança tem direito de brincar)
.
Fair play(station):
CBF – GTA
Noventa milhões em ações:
pra frente , Brasil –
salvo da recessão.
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Implantar mudanças nas máquinas:
a tecla 000.000 facilita a assinatura dos contratos.
E, se tivéssemos notas de milhão, as malas pretas
(ou as cuecas) poderiam ser mais apertadas.
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Contar de milhão facilita grandes medidas:
quantos milhões sem comida
quantos milhões de desgraçados em hospitais
ou de zumbis nas ruas
ou de carros vendidos
(apenas mês passado).
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O país tem que pensar grande!
Por isso que não te isentam os centavos da conta pequena, cidadão.
Tente levantar um estádio pra ver…
.
Matemática política simples:
Poucos = zeros à direita
Muitos = os mesmos zeros, à esquerda
.
Se o povo não tem pão
que coma milhão
cozido:
pérola do trocadilho
Brasil.
É o arbitrário que define o absurdo
(seja por falta ou excesso).
Atravessar o continente do tempo
pilotando 120 rodas
e reprovar na baliza do gol.
.
O buraco tem sua valia:
cabe cabeça que se esconde
(na hora de chutar: abaixa a cabeça e dá canhão
depois do jogo: é preciso levantar a cabeça…)
.
O tempo parado tem essa coisa de iconoclasta –
derruba andores nesse deserto dos passos solitários:
entre o homem e a bola todos os olhos do mundo.
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Mas, do lado de lá do precipício, tem gente:
náufrago na ilha congelada,
o goleiro espreita o meteroro.
Se passa, devasta a grama e alivia o universo que o lançou
(pênalti é obrigação de quem bate).
Se para, afirma o sobre-humano –
mágico que congela a bola na trajetória de bala
(pega na mão e despreza ao chão, como herói em tiroteio).
.
Os que fazem, descarregam o caixote pesado no chão.
Os que perdem, enfiam fundo a mão no rosto perplexo.
Os que levam, dão de ombros o imponderável.
Os que pegam, êxtase.
(e quando têm a graça de agarrar a bola,
mostram que era só um pouco de couro redondo).
.
Há o ímã:
trave mimada que quer a bola pra ela.
Há o vento:
o goleiro é o cara na arquibancada,
que agarra só a casca do perigo…
.
No meio do campo, estão os outros.
Se sim, correrão abraço.
Quando não, vestiário
(e um ou outro samaritano que estica a mão,
sem mostrar o olho-próprio, frustrado).
.
Se ganha quem chuta, são vários pés pra saudar.
Mas o bom é se goleiro pega:
o mundo todo
cabe
em seus braços!
Cansei!
diz a elite do futebol.
Aqui não fico mais
e se fico me jogo no chão
e me contorço
e chuto pra fora
e reclamo
e não venho
e risco as paredes no Twitter
e como comida na balada
e bebo na balada
e não volto na hora que vocês mandam
e fujo de casa
e odeio vocês!
.
Vocês, que pagam a eterna adolescência
com mesadas de milhar.
No fundo, também são pais mimados:
sair de casa devolve mais que um quarto
(da rescisão).
.
Quando nascem na apresentação pra torcida,
parecem que serão eternos.
Mas um dia, a família do lado balança mais grana
e o amor
vira processo na FIFA.
Reclamam os guerreiros de Aquiles:
isso aqui antes era sério!
Vestíamos a armadura e saíamos pra campo.
Havia Pátria, Deus, Família.
Mas descuidamos do calcanhar
e ficamos dungo-felipemelados na história.
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Berram os garotos de Narciso:
não entramos duas vezes no mesmo rio –
na segunda, o cabelo que espelhamos é diferente.
E se negamos a batalha,
não negamos a glória:
tocamos de calcanhar
(mas tomara que o destino não nos mostre sansões…)
.
Do alto do Olimpo,
Zeus todo-poderoso
caga um montão.
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Não é arte primitiva.
Artesanato feito em vida entendiada.
Mostra café-com-leite de patchwork.
É poesia. É épico, lírico, dramático
(o que dissemos sobre copas do mundo).
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Enquanto não são robóticas,
se vê a verdade da bola ou do choro:
o fracasso não vem apresentado por assessoria de imprensa.
Nas pernas delas corre sangue, como corre nas nossas.
.
O futebol jogo de gente, não video-game.
E há os olhos: mais bonitos, mas só servem à bola.
Essa coragem mítica de ir pra cima e fazer,
não ficar deitado no gramado pedindo cerveja.
.
Um futebol de corpo,
que se limita no limite do
mais alta, mais forte, mais rápida.
Um futebol de carne,
sem figurinhas coladas em álbuns.
Futebol que a gente joga quando chove –
mais urgente.
.
Ou
aquele velho lance:
os orgasmos
e suas intensidades…
Leitor@ hipotétic@ comenta no blog:
“Entre suas palavras que esfarelam,
sobre loucos da bola ou bandidos,
sobre messis ou mentiras,
nenhuma encontro que seja e também.
Parece que nos escombros das suas palavras,
o futebol só se chuta com pé de homem.
Ou antes, palavra homem não diz humano –
mas aquele que é futebol!”.
.
Car@ leitor@ hipotétic@:
tem razão.
Minhas palavras são distantes desse futebol,
onde o gol é grande e a luta é maior ainda.
Onde por baixo da camisa há sempre outra camisa
(o que deixa mais parecido com quem trabalha).
.
Se sou contra as hidrelétricas que barram milhões de euros
na mão de poucos,
porque não defender a reforma agrária do interesse?
Cortar a luz dos barbados latifúndios improdutivos
e valorizar a produção poética da pequena propriedade.
.
E ainda há Marta para promover o delírio.
.
Resolução: escovar a contrapelo essa história chauvinista.
Nos cabelos compridos, encontrar pérolas.
Ninguém mais vende seu bilhete premiado
sem especular na bolsa da seleção:
leilão-glamour neste hotel 5 estrelas.
.
Ninguém compra viaduto sem atravessar primeiro:
os ônibus de transporte de jogadores são tri-articulados
(cabem pajens, agentes, promoters, compradores, filhos, donos, groupies).
Comprador e mercadoria no mesmo frete.
E compra o staff fechado – facilita:
proibido vender carne com sebo adquirido pós-apresentação.
.
Não tem mais time bobo não:
o dono da padaria que paga a tubaína escala seu filho perneta
o vereador que deu o jogo de camisas entra no esquema
o dono do pasto onde se faz o campinho ganha os naming rights eternos
.
Não tem mais time bobo não.
Bobo é o torcedor.
São grandezas da semana:
marchar em milhão por arco-íris
(e contra-marchar em milhar pelo preto e branco)
grampear o telefone da noite alheia
ser joão-bobo em jogo-bobo
aceitar pintos grandes.
.
Temer que pintos afoguem a família,
ter inveja do pênis, da noite, do joão
afirmar João Batista como profeta de algum Hitler
enforcar-se no fio do telefone.
.
O futebol se importa com as coisas grandes:
gastos, sobras, planos, tretas, transas.
O falo imenso que derruba estádios
ejaculando muita grana no bolso dos
poderosos megalossauros
dinossauros da política megalomaníaca nacional.
.
Tudo se resume a pica, psicanalista:
ter ou não ter, afirmar ou esconder,
consagrar ou anular, ter três ou não ter,
ser dona ou não ser, masturbar ou foder.
.
Entre as megalomanias falocêntricas,
a maior é a mais dolorosa:
ter capada sua história pra segunda divisão
e quebrar o mundo
com paus de madeira.
O delay da TV partiu o tempo:
fez o grito da rua
chegar antes que o gol.
.
O delay é comparsa do sublime:
os gritos foram
para o calcanhar de Ganso.
.
E fez mais:
juntou dimensões –
um 2011 que luta
um 2010 que deslumbra.
Sei lá quando foi que começaram
a achar bobagem uma pessoa morta por outra.
Ou a matança lenta que se brasileirifica:
você tem medo do cara que rouba tua carteira
mas não liga pra quem rouba os direitos dos outros.
(é nessa hora que dizem que esse é um “poema ruim”).
.
Banal é falar o necessário.
A vanguarda se faz na defesa do buquê do vinho
ou na tediosa stand-up-ização das coisas:
o inferno são os outros.
.
Nessa,
os operários estão em três turnos construindo
estádios que não entrarão.
E aqueles médicos estão descansando (em três turnos)
o dinheiro que irão gastar na Copa.
Burros são os pedreiros, diz o stand-up comedy:
por que não roubam um saco de cimento também?
.
Os outros médicos (em três turnos, sem dormir)
se dividem pra atender eternos pedreiros brasileiros:
sacos de cimento vazios, parados em pé.
O inferno são os outros.
.
Uma aranha de cimento gigante ataca a cidade:
esqueleto de algum desvio de verbas
nesse filme B
(de Brasil).
Fica mal politicamente.
Perde prestígio nessa roda e começa a rodar naquela
a bolsona pesada de caixas (2) e (contas) paralelas.
.
Dentro do estádio,
vejo as paralelas que os pneus da maca
deixam na grama.
.
São caminhos gêmeos que não se dão:
o futebol-poesia
e
o futebol-todo-resto.
Elvis deixou o recinto?
.
Misturou mitologia e tecnocracia:
o futebol-blues, mítico dos negros
o country-club, típico dos brancos
dançar e correr no mesmo movimento
agradecer e pegar o cachê com a mesma mão
.
Assim (ainda é mitologia) ensinou a America a concluir no gol
com a precisão de sua voz.
E alavancou (agora é tecnocracia) a venda de violões
em mercados emergentes
(onde existiam outras lendas e tecnologias).
.
E seu corpo-mito virou corpo-tecnocrato.
Foi quando máfia.
.
Mas pra nós, de carne,
que reste só o eco dos gols em sua garganta:
Elvis não morrreu,
e ainda arranca em fenômeno
num planeta só de mitos.
Há foguetes mais letais viajando pelo país.
Motosserras que não se preocupam mais em se esconder nas luvas:
corta, mas não fuma.
Onde vemos estádios caídos, Eles veem dinheiro –
enxergo com defeito: retina de pobre.
Ver a trave sendo roubada do olho do povo
e ver a navalha que entope o olho morto da justiça.
.
Mendigos esmolam uma gota de chapisco
que caia da colher de grana que levanta esse campo de futebol.
O templo cairá em um dia e será reerguido em três anos (se der).
No leilão da licitação bandida, a lógica de trás pra frente:
a Ruína se antecipa ao Tempo e leva a obra.
.
A família Marcha pela rua:
se medra com o sexo anal dos outros
e nem se liga
com o tarugo de contas a pagar
que arromba o rabo preso do Brasil.
.
Quando essa churrascada dos Reis
pegar fogo
(um deles joga etanol pra acender o carvão),
os bombeiros
– com chibatas ao invés de mangueiras –
serão ouvidos?
Canso dessa sanha doida pra ter rei:
esse comichão por coroar 1
essa coisa de cercar latifúndios
fazer tudo soar mono-cultura.
.
Chega de número 1!
.
Meu coração é guloso:
não se contenta com um prato só.
Por isso, rodízio de craques –
me cabem folgados
Pelé, Messi e quem vier.
.
Essa carne contada que os jornais embrulham
não me faz nem cócegas:
quero a
orgia
de Santos, Barcelona e quem mais vier.
.
Como não luto mais em mim
Marx ou Rimbaud,
te digo também:
se lambuza.
.
Não quero essa de pódio.
Prefiro a utopia da minha mesa de botão:
jogo com 22.
I.
A tormenta de denúncias
deve ser manipulada com mãos de borracha:
apagar o que for preciso, capitão.
.
Não se tormenta, capitão:
eles não sabem o que fazem.
As cédulas são do mesmo papel dos cartões
em libertadores: geram dólares.
.
II.
Grito pra estádio:
Ó capitão, meu capitão:
deixa eu também
meter a mão!
.
III.
Que constituição escora as casas maiores do futebol?
São empresas cuidando do que é meu e teu.
Nem só de grana somos roubados,
mas de fazerem porrada do que é poesia:
eles controlam tudo.
Com suas mãos de autoritarismo
mumificam regras
e demolem estádios.
.
São pais de namorada sádicos:
impedem que a gente namore
e ainda roubam a nossa grana contada pro cinema
e vão pros clubes acender charuto com as notas amassadas
que tiram da nossa cara.
.
IV.
Só não sei porque continuamos
com isso de
capitão.
.
V.
Não é hora de fazer motim?
Tomar o convés
e botar na prancha
esses que se chama de gângsters?
.
E guiaremos o nosso navio,
levando a namorada
pro cinema
pra ver o Barcelona.
Gasto dizer massacre
(e ainda diz pouco: diferente dominar e aniquilar).
Antes possessão:
trancar o outro time no porão
tocar a bola pra atenção obcecada dos olhos
fazê-lo se dar sem resistência.
Estocolmo futebolístico.
.
Mas na poesia azul-grená
sobram coisas de liberdade demais
pra se pensar em metáfora-crime.
.
Achei: o outro time se entrega sem algema.
Esqueça Estocolmo:
o outro time joga
simplesmente
apaixonado.
Xavi dá aos olhos
astúcia de satélite.
Vivemos em tempo de não pode
misturado com o pode muito:
explicando –
não pode parar a avenida pra protesto,
só pode pra inauguração.
.
Isso, gera a binomia de tablóide:
não fode tua casa, mas fode o mundo.
Ou:
não fode nem teu próprio quarto e quer foder o mundo?
.
Trocando os graúdos:
mete a mão na grana
só não tenta meter por baixo da saia.
.
E assim o problema de marido e mulher
mete a colher
no gargalo da garrafa:
esconde que saia o gás lacrimogênio.
O país se esmera em tecer tapetes
que tampem, tapem:
escondendo o pó
debaixo da língua.
.
Mima-se a criança que ganha sua mesada:
se derrubar o Maracanã de lego
a gente dá dinheiro pra comprar outro.
A cobertura de grana
derrete e suja a boca gigantesca
dos donos do mundo e dos filhos dos donos e dos netos dos donos e dos
.
Empurra pra debaixo da cobertura
o que nasceu pra subterrâneo:
ajudar acabar com a escravidão
ensinando a pescar
num córrego aí.
.
E monumentalmente expurgue
qualquer traço de um país de elites:
racismo
é mania de limpeza.
.
Esse tapete de 8 milhões
de informações decoradas na prova de geografia:
aumentando pra cima.
Formação das cadeias de montanhas
de sujeira.
Nessa época de corte de luz que vivemos
bolsonarismo
polis higiênicas
S com som de B:
é tentador negar as ideologias.
.
Mas sou daqueles antiquados
que ainda são comunistas depois dos 18:
liberdade igualdade fraternidade.
.
No contexto do e também futebol:
Rivaldista.
.
Vai, jogador-poeta, pega tua arte de bola e cai fora daí:
engessado nesse banco de espera
desse hospital.
Limpo, organizado – diferenciado?
A manhã começa duvidando: tá me zuando?
Foice que carpe mais do que o contratado,
abrir um portão no lugar de abrir uma janela,
Pica-Pau arrancando a casa toda com um trator.
.
As paredes eram gambiarras de durepóxi?
Ou todos os Seu Sobrenatural resolveram
tomar os ônibus cheios
até os estádios gelados da noite?
Vai saber.
.
O dia, aqui pelo menos, está bonito.
Cidades estão devastadas apenas dentro da gente.
O terno – neutralizando o colorido, vamos dizer.
Sacolas e bolsas se batem nas calçadas, iguais.
.
Outras, carregam sorrisos.
Terezinha de Jesus numa queda vai ao chão
e riem da sua cara os torcedores dos outros.
“Só cai quem anda!”, diz a moça.
Não adianta dizer isso, Terezinha…
Teu luto é teu.
.
Alguns perdem, outros ganham…
Essa é a essência do jogo…
Você não ganha nada com isso de sofrer…
O Brasil é o país do futuro…
.
Tem gente que bota a camisa do time.
Mas é só tapume
pro coração em obras.
Não é guerra.
Mas faz fácil uma:
só jogar querosene de verbos
na eterna fogueira das ignorâncias.
Assim:
aumenta uma polêmica de vácuo,
e deixa fermentar o dia todo
nas atualizações constantes
de internet e rádio.
Não é guerra.
.
Não é guerra.
Tire o artista, deixe a batalha:
Guernica sem Picasso.
Assim:
alimente os técnicos com microfones –
que a arte é pitbulizada na primeira página.
Não é guerra.
.
Não é guerra.
Compre e esconda atrás da novela
(a noite de um dia duro).
Assim:
dispute o último ônibus
com aqueles que torciam junto com você.
Não é guerra.
.
Não é guerra.
Fala-se de jejuns: fome entre almoço e janta?
Crises: mísseis de toalha deixada na cama?
Escândalos: o elefante caiu na lama.
Assim:
quando todos quiserem olhar
pela fechadura do baixo do pano…
a gente tira a roupa da Barbie e só vê plástico.
.
Não é guerra.
Guerra é o que acontece depois.
Assim:
mate Bin Laden e imprima
a foto morta em cada olho que houver.
Guerra é o que acontece depois.
Romper lógicas e átomos.
Tirar o vergalhão que amarra a espinha:
negar cimento, ideologia, tática.
.
Arco-íris grafitado sobre ódio.
Fazer silêncio em congresso de verdades.
Jogar de Ganso contra pedregulho.
.
Ser ave e poeta, quando o se espera é máscara e bonde
(bondes empalhados nos trilhos círculo-vicioso de um parque decadente).
Ser invisível, quando o atual é tirar 3×4 de bronze
para o passaporte que se inaugura na praça.
Ser utopia, não saudade: o olho com que fita é futebol.
.
Rompe lógicas, poeta.
Joga com os braços abertos:
sem se preocupar com a carteira de investimentos
caindo de seu calção sem bolsos.
O cartão amarelo explica o mundo.
Justiça em tarjeta:
condena cada fuck gritado em câmera
absolve cada racismo escarrado cara-a-cara.
.
Põe cones e fitas zebradas
e guardas e catracas em cada passagem:
segurança do espetáculo (sic).
.
Amarela o centésimo gol.
E o bigode que diz obrigado, pai.
E a camisa que diz Deus.
E a camisa que diz Não.
Amarela a graça e o protesto:
isso é hoje.
.
Mas quem gerencia a carreira do hoje?
.
Disseram que a máscara da máscara
era estratégia de marketing.
.
Eu na máscara meu: meu deus pai bigode sim.
Narciso molhando o rosto no rio.
A estratégia de marketing explica o mundo.
Na saída da feira, eles nos dão essas
moedas de metáforas prontas:
o pastel e garapa da poesia esmolada.
.
Mas laranjas e bananas.
Laranjas que derramam sumo nos contratos
e deixam as mãos manchadas no sol.
Bananas atiradas aos bananas:
“O racismo não ocorre nessa feira de escravos” –
dizem os racistas, donos das bancas, das e dos bananas.
.
A feira hoje em dia é só dinheiro.
.
Chegar cedo e armar as barracas no saguão dos hotéis:
expor seus craques como se em esquinas,
oferecer em amistoso uma fatia gelada do mais puro abacaxi,
a suculência de um DVD dos gols do morango,
as bananas e as laranjas.
.
Os jornais que embrulham a covardia dos bananas
mentem que aqui as feiras são diferentes:
não atiram bananas em racismo –
somos um povo miscigenado.
Somos vitamina.
.
As criancinhas negras do fim de feira
jogam bola com uma laranja.
Os rádios eram quase caixotes.
E eles ocuparam o campo.
A bola e Pelé no alto.
As roupas de outro tempo, as criancinhas da enchente e um país de almanaque de fotografia
e livro didático de História.
.
Mil de goleiro é cem.
.
Os rádios são minúsculos.
E eles foram barrados na cerca.
As fotos são coloridas e as enchentes
são o barro que suja o futebol de emissoras.
.
O tempo não é artigo de constituição.
Passa arrasando simbologias e nossos cabelos.
.
Pelé era esse país de tanque de guerra e carnaval.
Rogério é esse país de spray de pimenta e pay-per-view.
.
Certo que as criancinhas são os espaços
que já vêm preenchidos no formulário de Gráfica 1969 do discurso.
E assim, lembrar que o gol-100-soco na cara do rival é orgasmo da torcida
tem uma anacronicidade no texto politicamente correto do Word 2011.
.
Entre esses tempos, das cidades cheias de carros – fuscas ou fox?
De lá pra cá, com blogs e celulares fazendo o Canal 100 caseiro.
Da enchente pra enchente.
Do Maracanã que ufana ou de Barueri, cidade do Alphaville.
Esses tempos do mesmo país.
Que ainda tem os mesmos donos:
em TV, igreja, ônibus e futebol.
.
Nesse precipício entre 1000 e 100,
entre deus pagão e herói de filme,
entre Pelé e Ceni:
o cartão amarelo explica o mundo.
Mesmo com tanta palavra em álcool gel,
lambuzada de moralisminho
e a imoralidade dos ladrões,
lambuzada de grana que nem sei contar,
Mesmo que calem a boca dos que berram contra
e convençam que racismo, pobreza e mentira
são só coisas que se ensina na péssima escola pública,
Mesmo que esse ópio seja fraco,
de papoula de plástico comprada em Extra perto,
que esse pão seja de pano – pra comer e lavar tá novo,
que esse circo seja só saudade de um velho filme dos Trapalhões,
Mesmo que amanhã os jornais não deem pras bananas
o mesmo espaço que dão pras dancinhas,
Mesmo que os protestos todos aqui em nossas avenidas
sejam chamados de baderna, já que não têm a
praticidade de acontecer na arábia,
Mesmo que o dia comece com a vontade de que acabe logo,
Mesmo sendo um cidadão latino-americano
vivendo nesse tempo,
sem poder muito mais
do que sorrir
com o gol do Ceni.
O pão custa caro.
Cheio de bromato e bromações e bromatices.
Há passeata contra o preço do pão.
Mas a polícia apimenta a casca dura
e dá afta na boca sem dentes de quem reclama.
.
O circo é caro.
Empilha na bilheteria várias passagens de pão
e vem cheio de bromato de bromações de bromatices.
E mais – circo antítese: que graça tem em ser público e palhaço?
.
Sempre me prometeram o pão e o circo.
Bastava fazer minha parte: ser conceito em um livro de história.
Entrar com a camisa da torcida desorganizada pra foto.
Ficar na geral e, no máximo, trocar meu anonimato por um número que me represente.
.
E a tua parte, Imperador?
O pão custa caro.
O circo me faz de palhaço.
.
Ser leão em outro país?
Parar de gostar de circo?
Comprar um bolo e ficar engarrafado nas avenidas-padarias?
.
O pão é caro (e enrosca na goela-rua entupida de farelos de bolo).
O circo é caro (e o dono me faz pay-per-viewar jumentos disfarçados de cavalos dançarinos).
.
O ombudsman responde: o melhor a fazer é emigrar?
São apelidos.
Garoto chuta e ganha rótulo:
se rosto, se jeito, se cabelo – pega o nome do outro que já tem.
E assim, 3 ou 4 loves ou inhos ou ãos repetidos.
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E 3 ou 4 jogos sem vitória.
Chama o DP e corta o probatório:
se proba ganhando, a proba dos 9 (pontos).
.
E lá vai o corpo estendido no chão:
vietnã de joão-sem-braços pedindo pênalty,
bed in do homem cordial pedindo de beicinho ajuda pro juiz
ou multidão de joão-com-braço! falando que
seus braços estavam, absurdo, colados ao corpo –
distorção de superbonder.
.
E lá vão bambis e gambás cruzando a auto-estrada dos comentários:
homofobia 24 horas, delivery de piadas prontas
envolvendo cu, bolas e palavras gastas, centenada, soberania –
tédio!
.
Ah, futebol brasileiro!
Não morre assim feio:
nesse sofá sujo sentado em noite de quarta,
como vedete do passado
que perdeu tudo
apostando em cavalo.
Primeiro, eles ofendem de guerreiros – e não falamos nada:
nossa cervejinha dogma de cada dia
abençoa.
.
Depois, invadem nossa estética,
matam nossa beleza
e enfincam um dunga de gesso
no nosso jardim – mas não falamos nada.
.
Um dia, limitam o jogo a
um pisca-pisca de olhos no meio-sono:
pesadelo
de bolas por cima do gol,
e mutilados de araque com assoprões na canela,
que se contorcem na pré-madrugada do tédio.
.
Outra hora, entram pra pegar água na mangueira
e largam vazando cada 30,00 por fim-de-semana,
cada banheiro nojento,
cada guarda cavalo
e ônibus lotado
que seca nossa paciência.
Mas não falamos nada.
.
Daí, vêm com tratores e petições
e rasgam todas nossas palavras no meio:
pisoteiam as flores das mais fáceis metáforas,
matam a memória do dia que, pela primeira vez,
o futebol
foi isso tudo pra gente.
.
E nesse dia, já não podemos falar nada.
Pois não passamos de analfabetos imbecis.
.
Mas amanhã, a gente berra:
mobral de consciência
tomada de papel
e pichamos bem grande
em letras definitivas:
Agora chega!
Que tipo de piedade é essa
que perdoa o idiota
que numa idiotice
escorrega o chute
na taça
e derrama
cerveja, esperança, euros, carreira?
.
Que espécie de presente é esse
que dá palácio
num escorregão?
Taj Mahal
entregue pra vizinha:
um m ou um n um k um y
não fazem diferença
na área escorregadia
do zagueiro entregador.
Não há Salomão com espada de dez gumes
disposto a fatiar bolinhas de ferro fudido –
há Reis, não Sabedoria
na apostila de clichês dos Confederados.
.
Dá uma bolinha pra cada um logo e
deixa a armação da taça neutralizar careca
os lados que negam lógica e geometria:
são opostos e iguais – aqui 13 estados, ali Eixo.
.
Pergunto onde anda a Tropa de Choque nessa hora.
Ontem, descartilageou narizes em democracia,
hoje cuida dos carros dos barões
na porta da CBF?
.
Os porcos, dizia-se, andavam em duas patas.
Vestiam-se como homens,
falavam e bebericavam taças de champanhe.
.
E decidiam, em encontros fechados nas salas de reuniões,
a quantidade de lavagem
que dariam para os homens
(rotulando os barris: “FUTEBOL”).